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terça-feira, 26 de junho de 2012

Rectângulo arredondado: IDEIAS & OPINIÕESRectângulo arredondado: IDEIAS & OPINIÕESO caminho que dá ao abismo

BENEDITO MACHOCO



“A mulher deve deixar de se considerar o objecto da concupiscência do homem. O remédio está em suas mãos mais que nas mãos do homem” (Mahatma Gandhi ).

A Luísa é uma mulher sem auto estima, despojada. Perdeu o gosto pela vida. Espera pelo seu dia, já implorou muito à Deus para que a tire desse mundo.
- Ó Deus pai, porque continua me mantendo viva neste mundo cruel de tanto sofrimento? Porque não me leva de uma só vez para junto de vós? – Implora desesperada a cada anoitecer. Não vê a hora para partir desta vida, o mundo comenta mal dela. – Com a idade que tem ainda continua a viver sob tutela dos pais, não tem marido. E olha só para ela, nem tem vergonha, continua a parir filhos sem pais em casa dos pais. Faltam só dois para completar uma equipa de futebol. Acusam.
A Luísa que em tempos fora a menina mais bela do bairro de manhaua, hoje, infelizmente, passa as noites em claro, caminha alerta sob pena de surpreender os transuentes escarnecendo-a às costas.
A história de Luísa é mais uma de tantas mulheres moçambicanas, quiçá do mundo, que no passado tiveram escolhas erradas ou por outra, deixaram-se entregar aos prazeres mundanos motivadas pela sua beleza feminina bem proporcionada, de apelo sexual, característica de mulheres negras. E ainda pelos bens materiais alheios. Viveu durante quase toda sua adolescência cercada de rapazes da sua escola que, vigiavam de quando em quando a sua metamorfose. Rejeitou quase a todos os rapazes que pelo menos aproximavam-se-lhe com boas intenções, que a desejavam para no futuro casar com véu e grinalda no altar. Entretanto, alegava serem pobres e que não a levariam a lado nenhum, até que um dia conheceu um tal de Ambrósio ex-regressado da Republica Democrática Alemã (R. D. A). O homem era muito poderoso, detentor de um vasto acervo material desde aparelhagens sonoras (RFT), motorizadas de marca MZ, vídeo cassete, televisores, geleira eléctrica e a petróleo, fogão eléctrico, gerador de energia eléctrica e outro mobiliário de invejar (em 1990 era luxo ter um televisor, até porque contavam-se aos dedos da mão as famílias Quelimanenses que possuíam esta “caixinha mágica”. Tinha uma casa acolhedora, o seu quintal era um clube de cinema, nas noites as crianças acorriam-se para brincar de baixo da luz eléctrica.
Foi deste homem de quem a Luísa apaixonou-se, um homem casado que tinha quase a idade do seu pai, o homem mais desejado do bairro. Alegrava-se com os passeios na boleia de MZ com um homem vestido de fato de napa em pleno verão no asfalto.
Ambrósio prometera-lhe um mar de rosas, um apartamento no bairro administrativo. Pretendia distanciar-se do chão que o viu nascer e crescer, sentir-se verdadeiramente no prédio, ver a cidade aos seus calcanhares,  a grata mirragem das águas do rio dos Bons Sinais. Sempre viveu agoniada por ter pais pobres, tinha até vergonha de os apresentar aos seus amigos, maldizia do seu bairro, sem passeios, estradas asfaltadas, um bairro propenso a cheias.
Com efeito, ela foi vivendo de ilusões, não perdoou o seu jovem corpo de adolescente, entregou-o totalmente ao Ambrósio, o bajulador de miúdas da zona. Com seus dezasseis anos tornou-se mãe de um menino indefeso, inocente, fruto do pecado. Abandonou a escola na quinta classe. Os pais, simplesmente mantiveram-se indiferentes quanto ao comportamento tomado pela filha. Limitavam-se apenas em se regozijar com as delícias que a filha servia à mesa, desde corned-beef, pão, alface, margarina, bolachas de farinha de milho e alguns quilos de carapau e arroz. No entanto, haviam encontrado na filha um jazigo de prosperidade, que podia sanar com as necessidades primárias da família. Para eles, ela podia passear á vontade, porém, mediante uma condição que ia desde a responsabilidade pelos suplementos para o recém-nascido, o resto da família e algumas moedas para o Sr. Madoro o pai da rapariga para comprar algumas chidjangwas catchassu (aguardente fabricada na base de farelo fermentado; de cana doce ou de frutas). O bebé ficava sob tutela da dona Mwandrovesa, mãe da Luísa a sua confidente.
Os tempos foram passando e o agregado familiar foi aumentando em quantidades assimétricas a qualidade de vida que se levava no seio da família. Falta leite para as crianças, falta almoço, falta jantar na mesa; a casa virou um inferno as crianças choram em tudo quanto é canto de casa, não há sossego. O Sr. Madoro reclama das suas habituais chidjangwas de catchassus que já não as via fazia tempo.
Não obstante, Ambrósio evaporara da vida de Luísa, não quer mais saber dela, roubou-lhe a virgindade e deixou-a com máculas indeléveis. Os filhos conhecem-no a distância porque um dia a mãe os dissera que aquele homem que vai de mota era o pai. E assim eles dizem aos amigos ‘‘ aquele senhor que está a guiar aquela mota é meu pai’’.Portanto, é nestas condições que se encontra a nossa amiga, abandonada, conspurcada sem beira e nem eira. Luta por um marido, um que possa a aceitar com todos seus filhos, o que não é fácil numa sociedade onde uma mulher deve se casar virgem. É verdade que nos dias que correm as sociedades africanas tendem a assimilar comportamentos ocidentais, quase já não é problema nenhum casar uma mulher que já tenha procriado, o que é bom no meu ver. Porém, é sempre bom iniciar a vida á dois, isto é, ambos participarem na construção do seu futuro, desde a superação de obstáculos encontrados ao longo da caminhada até o erguer do troféu e, para que ambos se sintam protagonistas da vida que levam e que se evitem as expressões: essa casa é minha, sai da minha casa, os teus filhos são insuportáveis etc.

 

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